Lavar alimentos pode ser inútil para tirar agrotóxicos, dizem especialistas
Deixar vegetais de molho no vinagre antes de levá-los à mesa pode ser ótimo para matar micróbios, mas nem sempre vai funcionar quando se quer tirar agrotóxicos de frutas e verduras, relataram especialistas ouvidos pelo G1.
A preocupação com resíduos tóxicos na comida ganhou força nesta quarta-feira (24), quando um relatório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apontou alta presença de agrotóxicos nos alimentos brasileiros. De 3.130 amostras coletadas pela agência, 29% apresentaram algum tipo de irregularidade.
Segundo Anthony Wong, diretor médico do Centro de Assistência Toxicológica (Ceatox) da Faculdade de Medicina da USP, “se o agrotóxico for de superfície, de aplicação limitada à parte externa do alimento, elimina-se o risco na maioria das vezes lavando bem”, diz. Os casos do morango e do tomate, por exemplo, poderiam ser “facilmente resolvidos” assim.
A dificuldade cresce nas situações em que há penetração da substância. “Nesse quadro, a fervura pode inativá-la, mas há agrotóxicos à base de zinco ou estanho, à base de metais, que são chamados estáveis”, afirma Wong. “Quando isso ocorre, o aquecimento não inativa, logo não reduz o perigo.”
O médico Wanderlei Pignati, professor de Saúde Ambiental na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), é mais cético em relação à água. “[Lavar os alimentos] não resolve praticamente nada. Vai eliminar o agrotóxico que tem na casca, mas o grande problema está dentro”, afirma.
Laboratórios – Em 15 de 20 culturas analisadas pela Anvisa foram encontrados ingredientes ativos em processo de reavaliação toxicológica junto à agência, como o endossulfan em pepino e pimentão; acefato em cebola e cenoura; e metamidofós em pimentão, tomate, alface e cebola.
Já existe no Brasil uma “indicação de banimento” para as três substâncias. Dirceu Barbano, diretor da Anvisa, afirmou na quarta-feira (23) que esses ingredientes causam problemas neurológicos, reprodutivos, de desregulação hormonal e até câncer.
De acordo com Pignati, a estatísticas não mostram essas doenças relacionadas a agrotóxicos porque é difícil fazer exames para identificar substâncias tóxicas no organismo. “Aqui em Mato Grosso, se eu quiser fazer uma análise de suspeita de resíduos de agrotóxicos no sangue ou na urina, tenho que mandar a amostra para o Rio de Janeiro ou São Paulo”.
Consumidor impotente – Segundo Wong, do Ceatox, a total eliminação de situações de risco depende do governo. “Aí, só fiscalização mesmo. Não tem como eliminar por lavagem ou fervura.”
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) defende regras mais rígidas para agrotóxicos. “Dentre as medidas necessárias está a reavaliação toxicológica das substâncias pela Anvisa, uma vez que vários agrotóxicos utilizados no Brasil já foram proibidos em outros países, diante das evidências de seus riscos”, comunicou a ONG em nota ao G1.
Dentro dos padrões – Para o engenheiro de alimentos Carlos Eduardo Sassano, professor da Universidade de Guarulhos, o problema seria resolvido se os agrotóxicos fossem utilizados da maneira correta. “Se fossem usados dentro dos padrões permitidos, não teria problema”, defende.
Segundo ele, o consumo de alimentos orgânicos poderia ser uma boa alternativa, mas é difícil haver produção suficiente. “Estamos falando de uma sociedade moderna, onde a produtividade tem que ser alta. Por isso a gente não vislumbra agricultura sem agrotóxico.”
Voz dissidente – O médico Angelo Trapé, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), discorda da opinião dos colegas. Segundo ele, as irregularidades encontradas pela Anvisa não mostram que haja perigo ao consumidor, pois a quantidade de agrotóxicos nos alimentos é muito pequena. “A população pode ingerir alimentos de maneira segura que não vai causar nenhum dano à sua saúde.”
Os fabricantes de defensivos agrícolas, por meio da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), defendem que os produtores rurais estão cada vez mais preocupados em aplicar corretamente os agrotóxicos.
“A Andef considera fundamental tranquilizar a população quanto à segurança dos alimentos tratados com defensivos aplicados de acordo com as recomendações agronômicas e oficialmente registrados”, afirmou a instituição em nota divulgada à imprensa. (Fonte: G1)
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